Perplexidade. Não há outra palavra para representar o sentimento da Magistratura Piauiense diante da ação do Congresso Nacional de derrubar 18 dos 33 artigos vetados pelo presidente Jair Bolsonaro no projeto de lei 7.596/2019, que define crimes de abuso de autoridade. Coincidentemente, a derrubada dos vetos se dá logo após decisão do ministro Luís Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal (STF), que autorizou o cumprimento de mandados de busca e apreensão nas dependências do Congresso para investigar a suposta prática dos crimes de corrupção ativa e passiva e lavagem de dinheiro.
Frisa-se que o referido projeto trata o abuso de autoridade de forma subjetiva, com tipos penais vagos e imprecisos, o que, para além da insegurança daqueles que tenham por missão constitucional fiscalizar, investigar e promover a persecução penal, enfraquece o combate à criminalidade e, o que é mais grave: ofusca a independência e autonomia de Poderes e Instituições, criminalizando atividades constitucionais.
É verdade que, nos últimos tempos, temos acompanhado uma campanha deliberada contra o Judiciário e seus membros. Direitos e prerrogativas constitucionais são tratados como benefícios, decisões são colocadas em xeque, magistrados são constrangidos publicamente, enfim, uma verdadeira cruzada de desmonte à carreira da Magistratura se mostra cada vez mais forte perante a opinião pública.
E esse movimento é feito de forma organizada, justo no momento em que o Poder Judiciário se debruça sobre as grandes questões nacionais. Essa onda difamatória se acentua à medida que este Poder protagoniza, junto com o Ministério Público, importante e fundamental trabalho de combate à corrupção no país. Tanto que, via de regra, a questão ostenta contornos políticos, quando, em meio à crise, surgem propostas como a lei 7.596/2019, que, em resumo, visa transformar o juiz em réu, apenas por cumprir o seu dever de julgar. Uma clara tentativa de intimidação e amordaçamento, um risco para a democracia e para o Estado Democrático de Direito.
A Amapi defende que a construção de uma sociedade livre e justa exige um Judiciário forte e independente. E isso somente será possível se for assegurada aos magistrados a liberdade para agir e julgar conforme seus entendimentos, devidamente fundamentados no ordenamento jurídico.
Certo é que estaremos vigilantes para que as tentativas de silenciar a Justiça não sejam concretizadas. Os magistrados não irão ceder a qualquer tipo de intimidação ou pressão, na certeza de que o Supremo Tribunal Federal, como guardião da Constituição da República, fará as devidas correções ao projeto, em defesa da democracia, da sociedade e do Estado Democrático de Direito.
Teresina, 25 de setembro de 2019
Thiago Brandão de Almeida
Presidente da Associação dos Magistrados Piauienses