A vida do Magistrado

19 de julho de 2022
Autor: Desembargador Luiz Gonzaga Brandão de Carvalho

Fiz uma retrospecção muito profunda dentro do âmago de minha alma, perscrutando a vida laboral de nossos colegas e vejo que as tribulações externas advindas de entes inescrupulosos têm abatido o psicológico, as forças físicas e espirituais, tornando muitos magistrados vulneráveis a idiossincrasias de verdadeiras víboras e escorpiões, que picam com seus venenos o que temos de mais valioso dentro de nós: o altruísmo de distribuir a justiça a gregos e troianos, sem olhar a capa do processo, o seu destinatário enfim. Muitos que aí estão (não citarei nomes), passaram pelos maiores constrangimentos morais, buscaram a força divina para ultrapassarem os obstáculos das representações vãs e ignominiosas; outros, não tiveram a mesma fortaleza, caíram no pranto do desencanto , “a latere” até mesmo dos mais próximos, adoeceram, se acamaram, perderam o elã da sacra profissão de julgar e foram entregues pelos títeres até mesmo ao sacrifício da morte! 

Sabemos, todos nós, que em qualquer sociedade humana, “errare humano est”, mas devemos discernir o erro não premeditado, não doloso, não vil, aquele erro que se pensa conscientemente que ele é uma verdade, fruto de uma especulação hermenêutica que pode ser reajustado, consertado, nas instâncias criadas exatamente para tal finalidade! 

Existem juízes justos, existem juízes injustos, existem clérigos injustos, existem políticos injustos, também justos, mas nunca devemos julgar os outros por amostragens ou cálculos inexatos, até porque não trabalhamos com ciências exatas. Dentro de nós, existe um edifício imortal, imaterial, invisível, chamado espírito , o corpo pode ser lesionado pela ação nefasta e irresponsável do homem que usar o poder como malefício atroz de seus inimigos, muitos gratuitos, mas essa alma intacta e inatingível que se tornou infestada por um corpo insano, terá nos umbrais “post morten” a garantia de ajustar suas contas pelas maledicências insanas praticadas neste planeta de ódio, dissabores, dissensões, poderes, guerras! 

Desde muitos anos atrás cito o concurso que fizemos para a magistratura , o primeiro executado por uma Escola Judiciária do Rio Grande do Sul , fora do nosso domínio territorial , muitos juízes , já naquela época , migraram para outras profissões na área da ciência jurídica, abrilhantando com suas inteligências no Ministério Público Federal, Estadual e outros segmentos afins! Tem sido uma constante esse fato, não pela falta da vocação, mas sobretudo pela instabilidade de impor a sua autoridade e o império da lei, perante seus jurisdicionados, mormente numa fase de ativismo exuberante que vivenciamos agora , erigindo um muro que separa a figura do togado com o jurisdicionado, seu destinatário maior. 

Temos que recompor esse flanco abismal que nos afasta, uma democracia para ser equilibrada terá os freios e contrapesos , o respeito intra muros e fora dele , não poderemos jamais sermos autofágicos, nos consumirmos , nos defenestrarmos num processo de autofagia constante , perdendo a nossa independência na sacrossanta habilidade de julgar, a queda vertiginosa na escolha da profissão , o perigo iminente de exercê-la nos confins desse imenso país , nos tornam presas fáceis diante criminosos e meliantes que tem a seu favor , cada vez mais as benesses da lei , em nome de uma sociedade injusta e desumana como se ela fosse a responsável pelos desmandos incontidos dos salafrários que estupram, sequelam, incendeiam, matam pessoas inocentes!

Temos que repensar urgentemente o direito penal brasileiro a nível dos países de primeiro mundo, não sermos coniventes com uma legislação frouxa, descabida, inócua, deixando a nossa sociedade nas mãos sanguinárias de indivíduos pérfidos que jamais deveriam circularem entre as pessoas de bem.

Sempre perante as pessoas incautas o juiz é vilipendiado , culpado, execrado, porque aplica uma lei que pune “ de fachada”, tendo logo os criminosos as tais progressões de pena que apenas aviltam ainda mais, este emaranhado de situações díspares e reprováveis que a sociedade tem que suportar “ de goela abaixo “ fizeram do juiz um marajá inexistente, vivem com dificuldades, salários achatados , quanto maior a família, maior a penúria, hoje funcionários públicos de categoria inferior em relação a cargos até do quinto escalão dos outros poderes do Estado!

A justiça brasileira, não pode conviver em estamentos isolados, explico, justiça do trabalho, justiça federal, justiça estadual , como se fossem uma “parentela” , como se não corresse nessas jugulares, o  mesmo sangue, propósitos e finalidades! Sempre fui contra este muro de Berlim, já derrubado, mas que continua a separar os anseios que deveriam ser comuns no tocante à justiça como um todo.

Lembro bem dessa frase de um grande Ministro do STJ, chegando a Presidente da excelsa Côrte, EDSON VIDIGAL, que com proficiência e saber, define muito bem a figura do juiz , e quando falo juiz o gênero , abrange desembargadores e ministros de todo e qualquer tribunal deste país: O JUIZ É A PESOA DE QUEM TUDO SE ESPERA , DE QUEM TUDO SE COBRA E CONTRA TUDO SE VOLTA .

« Voltar
©2017 - ASSOCIAÇÃO DOS MAGISTRADOS PIAUIENSES - AMAPI
Todos os diretitos reservados.
Rua Jonatas Batista, 735 - Centro • Cep: 64000-400 • Teresina – Piauí
Fone/fax (86) 3222-7824 E-mail: amapi.amapi@gmail.com